Opinião. Ecos para 2025: o que deixamos reverberar
"O que precisamos urgentemente ressoar são ações que promovam a integração"
Texto: Luísa Cunha
O que devemos levar para 2025, sem dúvida, é a compreensão do poder do eco. Tudo o que falamos e fazemos no nosso cotidiano como cidadãos ativos reverbera e provoca novas ações e discursos que influenciam a maneira como vivemos em comunidade.
Um exemplo emblemático é a transmissão de histórias aparentemente inofensivas, como as que justificam visões estereotipadas sobre mulheres brasileiras imigrantes. Essas narrativas ecoam até hoje na crença de que somos “fáceis”, sem pudor ou “sem respeito próprio”. Essas ideias, enraizadas em discursos do passado, perpetuam a opinião de que as relações com brasileiras devem ser tratadas com cautela, como se fossem intrinsecamente problemáticas.
Esse eco obriga jovens estudantes e profissionais imigrantes brasileiras a reconquistar um respeito que lhes foi retirado décadas atrás, mesmo sendo mulheres que hoje participam de forma significativa no mercado português, alcançando altos níveis de escolaridade e liderando iniciativas empreendedoras. Apesar disso, o eco negativo do passado ainda as acompanha.
Outro exemplo do poder do eco, vivenciado durante o ano de 2024 de forma ainda mais amplificada, é a narrativa de insegurança e violência atribuída à comunidade imigrante no país. Esses discursos não refletem os dados reais, mas ganham força nas redes sociais e no senso comum através da reprodução descuidada. Soltam aos quatro ventos que Portugal teria perdido posições nos índices de segurança da Europa, e vídeos compartilhados nas plataformas digitais reforçam a voz de que o "outro" ou o "diferente" é o problema.
Embora essas imagens muitas vezes retratem situações chocantes, elas não são a principal causa da queda nos indicadores de segurança, que, na verdade, são atribuídas a fatores como o aumento da instabilidade política, o crescimento da violência policial contra manifestações e a alta proporção de policiais por habitantes. A voz da verdade, dos fatos e dados detalhados, parece perder força em meio à caverna em que escolhem viver aqueles que querem, a todo custo, culpar os imigrantes pelos problemas do país.
Um episódio recente ilustra bem esse fenômeno. Os 52 depoimentos, válidos sem dúvidas, coletados pela Polícia de Segurança Pública (PSP), levaram a uma operação com revistas direcionadas a qualquer pessoa que correspondesse a uma descrição "suspeita". Essa descrição, baseada nos ecos contra imigrantes e políticas de limpeza das ruas do país, ganhou força com as vozes temerosas dos moradores da freguesia de Santa Maria Maior e, aos ouvidos, aparentemente destreinados, dos responsáveis pela segurança da comunidade ali residente, esses relatos soaram como um grito de desespero, o que resultou em dezenas de pessoas com sua palavra silenciada e interrompida por 2 horas, encarando o muro, cada vez mais alto, que as cerca e impede a integração no país.
Não se discute a importância da atuação policial contra a violência, independentemente de sua origem, mas por que ações tão intensas e imediatistas? Por que não investir em um policiamento mais presente e investigativo, que evite perfis baseados em raça ou aparência? Por que ninguém se atentou, naquele momento, à importância dos ecos produzidos por essa ação?
O que precisamos urgentemente ressoar são ações que promovam a integração; neste caso, a defesa de uma polícia com autonomia, mas cujas atuações, enquanto representantes do serviço público do governo, não gerem novos ecos de segregação e xenofobia. Que sua presença reverbere um discurso de justiça e igualdade, e não exclusão.
Clique aqui e siga o canal do DN Brasil no WhatsApp!
É vital que estejamos atentos aos discursos que reforçamos diariamente, seja enquanto representantes de algo ou em nossos espaços de convivência, como no trabalho, em repartições públicas ou na mesa do bar. As palavras que repetimos ou deixamos passar sem questionamento moldam o ambiente ao nosso redor e reverberam na formação de opiniões e comportamentos. Cada conversa, cada comentário, é uma oportunidade: de fortalecer ecos positivos que amplifiquem a compreensão e respeito ou de perpetuar narrativas que segregam e prejudicam. Precisamos escolher qual reverberação desejamos complementar e nos tornarmos agentes conscientes do que propagamos, assumindo a responsabilidade de direcionar nossas vozes.
Devemos, portanto, sair da caverna. Abandonar o conforto das sombras de bananeiras e daquelas projetadas por preconceitos e narrativas enganosas, alinhando nossas vozes com a verdade e a compreensão. É preciso que nossos discursos sejam ecoados de maneira responsável, organizando ações e diálogos que promovam integração, colaboração e respeito. Somente assim poderemos construir um futuro em que as diferenças sejam reconhecidas como riqueza, e não como uma ameaça iminente.
Convido você, leitor, a refletir sobre o impacto de suas ações e palavras. O que você ecoa está de acordo com a verdade dos fatos? Ou há traços de ecos passados e preconceitos nos discursos que você transmite? Suas falas, ainda que não imediatamente ou a alguém ao seu redor e de sua convivência, possuem o poder de retumbar discursos que segregam, desinformam ou ferem? Vamos policiar nossas palavras e ser mais criteriosos com os discursos que adotamos. Que possamos, em 2025, ouvir os ecos do passado com sabedoria suficiente para deixá-los bater à parede e serem cessados, e que possamos, de forma uníssona, mandar aos ventos ecos de empatia.

Luisa Cunha é advogada e imigrante brasileira radicada em Portugal há três anos. Coordenadora do Projeto "Duetos" e membro da equipa do FIBE, é pesquisadora nas áreas de direitos humanos, cooperação internacional e gestão de ONGs.
Leia também

